Livrinhos
Não posso deixar de prolongar o texto do Paulo sobre o lançamento mirabolante (ontem à noite) do último livro infantil que tem como personagem um miúdo de nome Harry Potter. Há que louvar as palavras do Paulo quando diz que «não vale a pena perder tempo a discutir as hipotéticas capacidades literárias de J. K. Rowling, assim como não vale a pena explicar a alguém que um jogo de futebol, só por si, não completa o espírito de quem quer que seja». O que lembra a cara de choque de alguém a quem se revele não ter sido subjugado pelos livros de montra de Dan Brown, Paulo Coelho ou o (menos medíocre e mais meritório) Miguel Sousa Tavares. Aliás, toda esta azáfama rodeando o evento especial do lançamento de um livro infantil bem se poderia ter passado com os livros da Madonna (da, e não de, por subentendido pedido da própria a partir do momento em que se quis chamar Madonna), que seria o mesmo, com excepção de um público adulto bem mais extenso.
Mas, por outro lado, não partilho do desprezo do Paulo pelo objectivo dos livros de J.K. Rowling, assim como não partilho o desprezo pelos doutos romances do arquitecto do Expresso. Enquanto os primeiros terão um público claramente infantil, os segundos têm a missão de agradar a um público sem grande interesse em bons livros. O ridículo acontece quando tanto uns como outros ultrapassam o seu terreno (lembrar Mel Gibson com o seu Hamlet) e querem ser fenómenos de genialidade. Os Harry Potter's são livros infantis, nada mais, e entende-se o fenómeno por reacção mini-intelectual aos rapazinhos que querem ser Cristianos Ronaldos quando crescerem (a começar pelo penteado e desenvoltura do torso). Ambos os tipos de crianças terão o mesmo tipo de desilusão quando perceberem que perderam muito do tempo útil dos seus primeiros anos de crescimento.
Ainda assim, sendo um livro infantil, não há nada a apontar de negativo, sendo que eu nunca passei, na idade pré-púbere, de Stevenson, Twain e Dumas light. Pior é quando os leitores avulsos dos «romances» de Rowling são, não rapazinhos e rapariguinhas, mas «rapazolas» de 40, com responsabilidades familiares. A isso chama-se abdicar do privilégio de «homem da casa».
[João Silva]
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