sexta-feira, dezembro 16, 2005

Amor horrível

-Queres dizer que viste Hitler?
-O meu filho também diz isso da mesma maneira: «O meu papá viu Adolf Hitler.» Hitler estava no outro extremo da grande salle.
-Fez um discurso?
-Felizmente, não estava perto. Deve ter feito uma comunicação. Comeu uns bolos. Estava de uniforme.
-Sim, já vi umas fotografias dele com modos sociáveis e numa atitude simpática.
-Uma coisa - notou Fonstein. - Não tinha cor no rosto.
-Nesse dia não estava a matar ninguém.
-Não havia ninguém que não pudesse matar, se quisesse, mas aquilo era uma recepção. Fiquei contente por não ter reparado em mim.
-Acho que eu também ficaria. Até se pode sentir amor por alguém que, podendo matar-nos, não nos mata. Um amor horrível, mas é um tipo de amor.


Saul Bellow, A Organização Bellarosa

[João Silva]