sexta-feira, novembro 18, 2005

Nunca mais

Que tolice, disse Ângela muito firme estatutária. Bárbara não voltará mais. Nunca mais. Ela nunca existiu. Eu existo. E ficou a olhar-me muito séria a existir. Mas nós não nos amamos, disse eu horrivelmente. E ela disse-me não me beija outra vez? E eu beijei-a e senti uma certa transmutação do meu corpo no seu corpo que chegava também ao meu transversalmente e era real e estúpido na irrealidade do meu sentir. Olhei-a depois no que ficara nela de mim, o rosto um pouco ruborizado, os olhos quebrados na sua dureza azul, um breve sorriso de piedade. Tomou-me as mãos sem me desfitar. O amor aprende-se, disse-me ainda, e tem isso assim uma grande importância? Ou inventa-se, que é o mesmo. Dou-lhe o meu número de telefone, para o caso de precisar, disse-me ainda. Ou quer aparecer à mesma hora? Ou procura-me em casa às cinco. Temos muito que conversar.

- Vergílio Ferreira, Na Tua Face

[Paulo Ferreira]