O povo americano é mesmo estúpido?
É típico de gente com uma grande formação em pequenos nadas criticar o «outro». Com efeito, para quem não sabe nada de nada, criticar o «outro» é o melhor desta vida. Por exemplo, a América. Quantos desses grandes especialistas em temas como o amor não correspondido sonham em escrever, um dia, um livrinho de setenta páginas que relate os podres escondidos da sociedade americana? Tendo em conta o número de livros de Noam Chomsky existentes nas estantes da Fnac, diria que muitos. Muitos são, então, os que sonham com a escrita do livro perfeito, com a escrita do livro que contém as «verdades» todas sobre o país de todos os males. Ora, não discuto o facto de os Estados Unidos serem dos países que mais problemas enfrentam neste preciso momento(alguns desses problemas representam, aliás, uma tragédia). Também não discuto o facto de existirem pessoas nos Estados Unidos que, só por si, conseguem tornar dispensável alguma da opinião antiamericana que corre por este paraíso celeste, a que se costuma dar o nome de Europa. Porém, e pensando bem nos problemas que a América tem por resolver neste momento, dir-se-ia que existem (muitos) países em situações bem piores. Olhe-se, por exemplo, para esse grande país qe é, se não me engano, Portugal. Olhe-se para a França, olhe-se para a Itália, olhe-se para a Alemanha. Olhe-se.
Desde que George W. Bush ganhou o seu segundo mandato presidencial que muitas têm sido as vozes a levantarem-se, quase histericamente, contra o país onde, a cada dia que passa, um novo cidadão tem direito a sentir-se amordaçado (Michael Moore, Sharon Stone, Jared Leto, blá, blá...). Chega-se, por vezes, a afirmar que George W. Bush só está no poder porque os americanos são burros ou estúpidos. Chega-se, aliás, a afirmar que só existiu 11 de Setembro porque já se adivinhava uma invasão a um inocentíssimo país muçulmano. No entanto, e esquecendo a argumentação mais bacoca de alguns cronistas que se passeiam por este alter-mundo que é o nosso, muitos são os que se esquecem de olhar para a sua própria casa antes de falarem das casas dos outros. Por exemplo, Sharon Stone. Em que país islâmico é que essa prendada senhora teria oportunidade para mostrar as suas partes íntimas? Jared Leto? Michael Moore? Mesmo dentro do nosso simpático país, que legitimidade tem um senhor que apoia Carrilho e Mário Soares em diferentes eleições, como parece ser o caso do brilhante, e não poucas vezes genial, Eduardo Prado Coelho, para ser contra a América de Bush? Ou para apelidar os americanos de estúpidos? Nenhuma.
Depois, vem a questão da estupidez. Ora , o que se quer dizer com a expressão «os americanos são estúpidos»? A meu ver, esta questão só poderá relacionar-se com o facto de existirem coisas como Yale ou Harvard, ou com o facto de existir um regime político que nunca na sua existência conheceu o cheiro de uma ditadura. Sob o ponto de vista existencial de Eduardo Prado Coelho, admito que a liberdade individual nos Estados Unidos seja muito limitada. Para chegar a esta modesta conclusão, parto do princípio que os americanos possam trocar de carro todos os anos sem grandes desvantagens monetárias. Parto também da tragédia de Sean Penn, homem que teve a oportunidade de ver o seu barco afundar-se em Nova Orleães, enquanto fazia o trabalho das autoridades à sua maneira (pela forma como o barco se afundou, estou em crer que Penn rege-se muito pelas regras portuguesas do «é agora ou nunca»). Brincadeiras à parte, parece ser surrealista afirmar-se, num país apertado como este nosso Portugal, que a liberdade nos Estados Unidos seja limitada.
[Paulo Ferreira]
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