quinta-feira, dezembro 22, 2005

Os ídolos socialistas

Segundo o Diário de Notícias, José Sócrates - primeiro-ministro que, se eu não soubesse que era português, suporia de carácter impoluto e divinal - veio criticar as declarações de Ribeiro e Castro, que atribuiu ao exemplo político prático marxista-leninista uma boa parte das culpas no terrorismo contemporâneo, como «irresponsáveis». É curioso que José Sócrates ache opiniões adversas «irresponsáveis», visto que convidou para a pasta dos Negócios Estrangeiros alguém que personifica a «Adinistração Bush» (como gostam de dizer) como a descendência «nazi» do século XXI, e apoia Mário Soares, um ex-Presidente da República que há muito que vê em Bush e em Blair os grandes fomentadores (ou incitadores) do terrorismo dos extremistas islâmicos. Ora, Ribeiro e Castro, se não olharmos a possíveis preconceitos políticos que possa ter e generalizar, está no seu completo direito de ter opinião sobre os valores e exemplos que regem os portugueses e de os criticar se assim lhe apetecer, independentemente de ser ou não a visão correcta (em parte ou por completo).

Ao que parece, Ribeiro e Castro chamou a Che Guevara «um dos grandes assassinos do final do século XX». Percebo o problema. Aliás, em tempos de quadra natalícia, eu próprio me abstenho de ofender os santinhos. Tenho em conta a susceptibilidade dos pró-totalitários, e em especial a dos mais jovens, que se emocionam mais facilmente. «Che», que foi feito santo numa localidade da Argentina (e qualquer dia é Maradona), é uma personagem complexa. Inteligente, influente e com especial apetência pela guerrilha (forma de guerra), cedo se tornou um dos mais sublimes terroristas em nome do internacionalismo soviético (mais fiel a esta ideia do que Fidel). Por isso, se compreende que os jovens aspirantes a uma carreira hoje rara na Europa o tenham como um ícone distante e saudoso. O cravo da revolução, o símbolo da paz mundial, e a bóina ou crachá de «Che» Guevara são um conjunto de forças ocultas que, com ou sem explicação, se conjugam perfeitamente em muitas pessoas nos dias que correm.

Nessa mistura contraditória de valores, compreendo a incompreensão de Ribeiro e Castro. Só não compreendo é a púdica tentativa de «correcção» por parte de José Sócrates.
Apenas uma nota. Ao que parece, Ribeiro e Castro apontou «o cortejo de miséria na África contemporânea» como consequência de «regimes de esquerda que têm governado o continente». Aí, terei de discordar. Penso que os regimes a que ele se refere pouco têm de esquerda. E pouco têm de direita. Regimes militaristas, misturas de plutocracias com liderança de guerrilheiros, são situações (aqui, realmente, poder-se-ia dizer «fenómenos») específicas de África, embora muitos tenham, isso sim, como modelos os regimes socialistas mais famosos, em especial o soviético.

[João Silva]