sexta-feira, janeiro 14, 2005

The Royal choices

O «escândalo» em redor de Harry, o mais jovem e castiço membro do núcleo da família real britânica, não é mais que o sintoma de uma sociedade em contínua cisão com o sangue azul. E de uma sociedade em permanente entusiasmo quando se trata de saber como o Marquês de Pombal relaxava depois do horário de expediente, ou o que o D. Pedro IV pedia ao pequeno-almoço às nativas (que, diz-se, confeccionavam grandiosos petiscos locais).

Mas, uma vez mais, a regra tem excepção, e o Zé Povinho (a «unanimidade») tem desculpa. A desculpa, ou melhor, a causa legítima da sua indignação é simples: Harry é da família real. Harry nasceu com uma profissão a tempo inteiro, que, ao que parece, ainda não renegou. E descende de uma linhagem que, ainda não há muitas décadas, tomou nas mãos o destino do país, e a determinação de Churchill, para enfrentar a ameaça europeia de Adolph Hitler.

Liberalismos à parte, toda a gente sabe que Harry, como bom aspirante a grande líder (profunda admiração, sem sarcasmos), já lida com o amigo copo, mas devido à sua tenra idade (ou tenra consciência), ainda não o sabe converter em trunfo. Mas também todos sabemos que, se fosse uma foice e um martelo no braço do rapaz, a «indignação geral» não seria tão grande, ou até se viraria a cara aos milhões de mortos da URSS e demais réplicas para respeitar a «tolerância e a jovialidade» de um dos herdeiros à Coroa britânica. Mas nós, bons castiços, temos de ter «olhos na cara» (expressão que não morre) e memória imorredoira, para que saibamos gozar com a nossa própria ridícula e ditorcida condição humana, mas também para respeitar a memória daqueles que souberam resistir e recuperar de um dos jugos mais reveladores da História.

[João Silva]