Ser yuppie
«Oh Mariana, mas o mercado é eficiente!», dizia o rapaz, de mãos nos bolsos e gel no cabelo, enquanto passava por entre as mesas do restaurante. Ser yuppie é uma arte vedada aos menos hábeis. Dizem as más-línguas que o «que há mais é disso» - yuppies - e que qualquer um com um emprego muito satisfatório (boa remuneração e prestígio do fato executivo) mas de poucas perspectivas, pode ser um. Não é bem assim.
Ser um bom yuppie implica, entre outros, um exercício de memória dedicado. As frases feitas sem significado e sem contexto são obrigatórias. Mais, diria que são imprescindíveis se se quer sair do local com uma «boa primeira impressão» para voltar ao local seguro de si mesmo. «Mas, ó Martins, repara, as quotas são virtuais...», e o keynesiano fez a sua parte na conversa. O segundo yuppie deve responder à letra - quanto mais vazia a frase, maior o prestígio atingido, porque os demais rapazes não se atrevem a questioná-la e a distância hierárquica entre eles aumenta.
O estilo também é essencial para a vitória no mundo cão do «almoço dos yuppies». O estrelato é atingido com a ridicularidade mais óbvia. Barba feita e gel no cabelo puxado para trás são dois elementos-base da imagem dos efectivos bancários. E o telemóvel, é claro, é o sinal da vida ocupada. Quando a conversa transborda dos limites conceptuais do yuppie, o telemóvel toca sempre ou é preciso fazer uma chamada: «Então Fonseca? Tudo bom? O negócio da herdade, anda?» E está a honra salva...
Ao fim do almoço, as frases começam a escassear (e não faz mal, porque o restaurante está um pouco mais vazio). Uns vão à casa-de-banho e não voltam, outros saem mais cedo para o emprego (o emprego...). Os sobreviventes aventuram-se um pouco mais, mas, por mais inglório, o vocabulário e as frases decoradas acabam num instante. «Realmente, aquela fusão já faz falta...» «Pois é, pois é... E o nosso Benfica ontem??».
[João Silva]
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