segunda-feira, setembro 05, 2005

A América e os outros

A imprensa europeia, os jornais portugueses, as televisões portuguesas (até mesmo a vetusta «radiotelefonia portuguesa») e a opinião popular nacional já começaram a apontar baterias ao ímpio texano da Casa Branca. Para além de realçar, com um sarcasmo subtil mas que não passa despercebido, o facto de George W. Bush ainda estar de férias, o Público já acusava, na edição de sábado, o enorme peso do tema actual: a metafórica «passagem do furacão pela Casa Branca».

Mas não só os jornais estão «em cima» do acontecimento. Também a televisão, através de jornalistas com mais liberdade de movimentos, já deu o seu voto de pesar pelo furacão, logo seguido de uma análise profunda do Estado da Nação. Pergunta-se: «Como é possível que um país como os EUA seja apanhado desprevenido?». Uma pergunta que, dependendo de quem a faz, pode ou não trazer um infantil (mas não inédito) sarcasmo que nos dá a volta ao estômago, e que já não ouvia há quase 4 anos. Luís Costa Ribas, um jornalista que alguém (felizmente, não me lembro quem) já apelidou de «isento», exibia um profundo esgar de choque uns dias depois da passagem do furacão pelos Estados Unidos. A causa imediata? O furacão? Não. A destruição? Talvez, mas a razão era outra: as declarações do presidente Bush. Costa Ribas, reconheço, é, embora declaradamente anti-republicano, alguém que me parece gostar muito da América. Agora as razões pelas quais ele gosta do país, parecem-me ocultas.

Na verdade, toda esta azáfama política que começa a pesar, mais por obra da imprensa europeia do que da imprensa e orgãos políticos americanos, sobre os ombros de Bush faz-me lembrar aqueles momentos, tão tristemente, embora com uma aura quase cómica, repetidos no Médio-Oriente, em que, após um acidente de uma carroça que dá em explosão de combustível numa esquina obscura de uma aldeia, sai uma manifestação à rua: «Foram os americanos!», gritam, «os americanos!». Ironicamente, aos aldeões, tal como aos jornalistas do nosso continente, escapa o mais importante: nunca compreenderão porque é que, odiando tanto um país como os Estados Unidos da América, não conseguem deixar de pensar nas suas próximas eleições presidenciais.

[João Silva]