A arte de fazer rir
Preocupado com os problemas que, normalmente, se abatem sobre a cabeça de um indivíduo comum, dirigo-me a um local que dá pelo nome de SOERAD. Sendo um facto que nada neste país se faz sem uma longa espera, dirigo-me ao dito local com um certo nervosismo guardado debaixo da língua. Sabia que aquele nervosismo seria a melhor arma para vencer a burocracia das meninas que, habitualmente, pensam que para se tirar um qualquer exame, é necessário que se vá a uma repartição das finanças buscar um recibo ou qualquer outra coisa que lhe valha, que comprove a sanidade cívica de uma pessoa. O certo é que, quando cheguei ao meu destino, vi comprovadas as minhas preocupações. Lá estava a chusma habitual, a discutir as probabilidades de o Zeca ser filho do Barrabel, ou simplesmente a cantar em coro as vicissitudes da vida. Sento-me ao lado de um senhor que, pela sua aparência, dava ares de ser vetusto. Não me enganei, já que o senhor era mesmo um homem com larga experiência de vida. Mal me sentei e olhei para o infinito, o senhor tratou de me tranquilizar: «Aqui ou se espera ou vai-se andando!». Senti-me reconfortado. Passados cinco minutos, devido a qualquer coisa de que, até então, não me apercebera, a conversa mudou de formato. Mudou tanto que o senhor já me dizia coisas que, para a minha mente excessivamente preocupada com a minha pessoa, não faziam sentido. «Aquele material, a reboque do meu Ford , acabava com o meu reumático». Só momentos depois de ouvir esta curiosa frase, percebi que a expressão «aquele material» era metáfora para o respeitável rabiosque de uma jovem mãe que, devido ao conhecido temperamento acolhedor de que padecem os portugueses, se via obrigada a esperar a sua vez de pé, com a criança ao colo e com as suas formosas pernas em risco de se deteriorarem. E assim, deste modo divertido, consegui passar as horas de espera nas instalações da Sociedade de Estudos Radiológicos.
[Paulo Ferreira]
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