quinta-feira, dezembro 08, 2005

A ler

«Calotes», artigo de Francisco Sarsfield Cabral, no Diário de Notícias. Aqui fica a reprodução à Insurgente:

"Dívidas das autarquias asfixiam construtoras", titulava o DN há uma semana. Em causa estão 550 milhões de euros, sendo meio ano o prazo médio de pagamento efectivo. Há câmaras que demoram a pagar mais de um ano. Esta é uma forma de contornar os limites impostos ao endividamento das autarquias. Mas pagar tarde e a más horas não é um hábito apenas dos municípios. O Estado central deve dinheiro a toda a gente. Desde as dívidas aos laboratórios e farmácias, até aos atrasos nos pagamentos aos advogados que prestam apoio judiciário, os "calotes" multiplicam-se. A cultura de mau pagador difundida pelo Estado tem várias consequências. Aumentar a despesa pública é uma delas. As empresas e os fornecedores do Estado previnem-se, levando mais caro para se compensarem dos atrasos. Depois, essa cultura espalha-se a toda a sociedade, uma vez que o mau exemplo vem de cima. Na Europa, as empresas portuguesas são, de longe, as que mais tempo demoram a liquidar as suas dívidas, muito para lá dos prazos legais. Em Portugal apenas uma em cinco facturas é paga dentro do período que a lei determina. Ainda mais grave, esta forma de desmoralização da sociedade reflecte-se no fisco. Vão ser divulgados, e bem, os faltosos que não pagam impostos. Falta publicitar as dívidas em atraso das entidades oficiais. É que, se o Estado não paga a tempo e horas, o contribuinte sente-se moralmente desobrigado de cumprir as suas obrigações tributárias. Aí temos um forte estímulo do próprio Estado à evasão fiscal.Mas, como se viu durante o debate parlamentar do Orçamento para 2006, nem o Governo nem os partidos da oposição se preocupam com este cancro. Indício de como ele se encontra já enraizado entre nós. O que também explica que muitas empresas estrangeiras evitem trabalhar em Portugal.

[Paulo Ferreira]