sexta-feira, setembro 24, 2004

Do terrorismo islâmico (reprise)



Toda a gente, pelo menos os mais lúcidos, sabe que o terrorismo não pode ser exterminado. Pode-se complicar financiamentos, recrutamentos, execuções e negociações. Pode-se eliminar todos os líderes dos movimentos terroristas ou rebeldes mais violentos e inspiradores. Pode-se acabar com a “coisa”, mas não com o “motivo”, mesmo que este não seja nenhum. O terrorismo é o exemplo mais recorrente e mais evidente dessa “desmotivada motivação”. Não sabem exactamente onde querem chegar, não lhes interessa o adversário. O que interessa é: o que não querem que aconteça (um “Ocidente” e um Islão próximos e recíprocos); e a “sobrevivência” de uma civilização. Não vale a pena compreender o género de terrorismo que se dinamizou nos últimos anos, talvez na última década. É, pura e simplesmente, um novo tipo de racismo, e a uma escala global. Que, como se sabe, cria um ciclo regressivo difícil de impedir – o “racismo” cria “racismo”. Só que aqui não é propriamente a raça que é posta em questão, mas sim o passado, a cultura e o estilo de vida (sociedade, política, …) de cada um. Normalmente, seria possível combater isto se apenas se formassem duas opiniões e dois “mundos”: o “nosso” e o “deles”, o “certo” e o “errado”. Mas tal não acontece. O que acontece é a formação de duas visões e duas “soluções” de um impasse (Israel) que não tem solução, em que o “mundo árabe” mais cumpridor das leis divinas incita todo um povo ofendido a defender “o que é seu” contra Judeus e demais imorais da Europa e EUA, numa escalada “desesperada” mas meticulosa e homicida de violência estatal. Nasce então o quadro: os países árabes (Palestina, Iraque, Irão, Síria, etc.) “oprimidos” pela “expansão ocidental” lutam pela “sobrevivência do seu povo”. E então legitima-se um conflito que não deveria existir.

E depois há outros: os “ocidentais” que, impregnados de uma visão romântica da luta dos fracos idealistas contra os fortes, querem negociar com assassinos, assassinos esses que matam civis inocentes, por vezes os próprios familiares, em nome de uma cultura ou de um povo que, na sua maioria, só conheceram de longe. Tal como no clima pré-nazi, cria-se um objecto de missão e um adversário religioso para vazar frustrações. O que estes querem é uma troca de responsabilidades: “esquecemos tudo o que fizeram e damo-vos o que é vosso se pararem”. Seria o fim da civilização que sangrámos para construir e fazer evoluir, com especial destaque para as razões que levaram às duas Grandes Guerras do séc. XX.

O que estes adeptos do “diálogo” e da diplomacia pretendem não é um absurdo total. É a atitude correcta a tomar quando se pode facilmente prever que as consequências de um prolongar de um conflito serão muito mais terríveis do que as consequências advindas de uma trégua entre Estados. Sobretudo, crêem que os “outros” querem tanto paz e “igualdade entre Estados” quanto nós. Mas será que grupos terroristas como a al-Qaeda e o Hamas querem isso? O Hamas existirá e actuará sempre enquanto Israel existir. Pode-se acabar com todos os terroristas e “filiados” neste movimento, mas o “nome” ficará, tal como o “motivo”, a missão. O Hamas perdura. O ceptro é deixado à deriva até que os filhos dos terroristas do Hamas, criados sob a mesma doutrina de luta contra o Ocidente, a democracia, o Estado secular, as religiões não-muçulmanas, o agarrem.

É verdade que a guerra e a superiorização militar frente a grupos extremistas é uma medida igualmente agressiva e que vitima civis a toda a hora, como inevitável dividendo de qualquer guerra. É uma medida que, só por si, não tem efeito. Mas será que devemos ficar de braços cruzados? Ou pior, será que, frente às insinuações dos grupos terroristas, devemos culpar os nossos líderes pelas vítimas do terrorismo? Será que devemos ter medo e, como tal, negociar o nosso medo e o deles num perdão que vende a nossa moral? Deixo a resposta ao vosso critério.

De um ponto de vista pessoal, a acção militar é necessária sim. Imprescindível. A militar e a policial. Violenta, se necessário. O custo imediato da nossa arrogância é a troca das vidas dos terroristas “deles” pelos civis, tanto americanos, como espanhóis, como iraquianos. Mas é esta “arrogância” que nos permite sobreviver. E que, sobretudo, permite que o modo de vida que nos garante o espaço para discutir este tema possa sobreviver. Não se negoceia com niilistas, com quem espalha o terror. O passo maior terá de ser o de mostrar aos filhos desses homens que os pais sempre estiveram errados. Que morreram por eles, mas pela razão errada. E que eles não podem pagar com a vida os erros e a “missão de terror” dos pais. Mas, actualmente, o que se pode fazer é lutar. Lutar e combater o que e quem nos quer destruir e sempre quis. Enfim, não se pode negociar com quem nunca permitirá que sobrevivamos. Por respeito à nossa civilização e ao Islão.

[João Silva, 17/04/2004]