segunda-feira, agosto 22, 2005

Harrison Ford

Compreendo a aversão aos blockbusters. Partilho até desse tique de dividir entre «filmes bons» e «filmes para todos». Aliás, os anos 90 foram o terrível ponto de partida para tornar o cinema cada vez mais caracterizado pelas grandes produções, e cada vez mais procurado, apenas e só para ver o filme que vende mais. Um pouco como os livros. Infelizmente.
No entanto, ainda antes da terrível democratização dos blockbusters, esse tipo de filmes estava reservado a alguns bons realizadores que ainda conseguiam criar uma produção capaz de agradar mesmo aos mais pretensiosos. Para além dos realizadores (Spielberg, Lucas), um actor houve que se celebrizou por duas trilogias dos anos 70 e 80 que têm o minímo exigido para serem bons filmes: Harrison Ford.

Harrison Ford é mau actor. Penso que não há grandes dúvidas acerca disso. Penso que nunca um actor teve tanto sucesso e tantos êxitos tendo tão pouco a dar ao mundo do cinema, a não ser, talvez, um certo carisma. Inexplicavelmente, no entanto, não consigo dizer que não ao senhor, visto que os seus filmes brotam do chão quando menos se espera, instalando-se na televisão da sala - «Lá está ele outra vez... que remédio» - e, talvez imbuídos de mensagens ilegíveis, somos tentados a vê-los. O facto mais impressionante acerca de Harrison Ford é a forma generosa como se liga com o espectador, oferecendo-nos a capacidade de adivinhar tudo o que pensa e antecipar os seus diálogos, sem precisar de representar muito (na verdade, poupa-se, em geral, a esse trabalho maçante). Se isso é bom ou mau, não sei dizer. A verdade é que Harrison Ford tem sucesso.

Mas, dizia eu, Lucas e Spielberg trabalharam, nos anos 70 e 80, com Harrison Ford naqueles que foram os últimos bons blockbusters do cinema - embora, ao mesmo tempo, dando o exemplo para as trilogias e «mega-produções» de aventura que, terrivelmente, nos assombram deste 1990 -, ou seja, Star Wars (1977, 1980, 1983) e Indiana Jones (1981, 1984, 1989). Curiosamente, e tendo em conta a minha idade na altura em que os conheci, não consigo deixar de gostar destes filmes. É uma questão sentimental. Mesmo em relação a Star Wars não consigo fazer apreciações isentas acerca da sua qualidade cinematográfica, a não ser dizer que o papel de Harrison Ford lhe assenta que nem uma luva.
Mas o corolário de Ford vem com Indiana Jones. Eu, que nem gosto do género, considero-o um dos meus filmes favoritos, devendo muito, admito, à nostalgia do aparecimento dos filmes. Na verdade, Indiana Jones and the Last Crusade (1989) está entre os meus filmes favoritos de sábado à tarde, dispensando, no entanto, os restantes «êxitos» de Harrison Ford.

O segredo do seu sucesso está, penso eu, na estranha expectativa que nos traz nos filmes, uma sensação de que, a qualquer momento, vai tirar o chicote do bolso de trás. Assim, apenas pelo trabalho com os argumentos de Lucas ou com os filmes de Spielberg, Harrison Ford merece, da minha parte, um sincero e saudoso abraço.



[João Silva]