quarta-feira, agosto 17, 2005

Manuel Maria Carrilho e os pobres

Manuel Maria Carrilho, não contente com o seu papel preponderante em áreas como a filosofia, a política e a moda, deseja ser autarca. Pelo que se tem visto nas últimas semanas, o papel de autarca combina bem com a personalidade de Carrilho. Afinal, para se ser autarca não é necessário perceber de política, de filosofia ou de moda. No entanto, Carrilho, para além de perceber de política, de moda e de filosofia, tem vindo a demonstrar que possui uma capacidade enorme para muito falar sem nada dizer. Ou seja, o nobre génio português demonstra, a cada dia que passa, que reúne todas as qualidades exigidas a um autarca e mais algumas.

Uma importante muleta para o sapiente filósofo português em toda esta jornada tem sido Eduardo Prado Coelho, um homem profundamente conhecedor das matérias do coração e da vida. Com efeito, Prado Coelho, num gesto que parece nobre, prontificou-se, desde o primeiro dia desta batalha autárquica por Lisboa, a fazer propaganda sentimental a favor de Manuel Maria Carrilho nas páginas de um jornal habituado às frases oblíquas e violáceas do seu correspondente cultural. De qualquer forma, é provável que o jornal em questão não se incomode com as temáticas problematizadas por Eduardo Prado Coelho na sua coluna habitual, já que, como muito boa gente afirma, falar de Carrilho é falar de Cultura e falar de Cultura é falar de Carrilho.

Pelas frases soltas que se vão apanhando de Manuel Maria Carrilho, ressalta a ideia de que o candidato à cadeira de Santana Lopes preocupa-se deveras com os pobrezinhos. Não sei se motivado por José Sócrates ou se motivado pelo estado em que se encontra o país, Manuel Maria Carrilho pretende melhorar a qualidade de vida dos lisboetas. Para isso, diz Carrilho, é necessário afastar o «técnico» Carmona Rodrigues dos comandos da capital portuguesa e fazer com que «o Túnel do Marquês» (vou citando certos lexemas abundantes no candidato autárquico) acabe na Rua Castilho. Contudo, o processo chave para o desenvolvimento de Lisboa é o cosmopolitismo. Não sei ao certo se Manuel Maria Carrilho pretende fazer de Lisboa a capital industrial da Europa e, por conseguinte, atrair meio mundo aos seus portos ou se Carrilho ambiciona provocar um incremento avassalador no que respeita à criação artística no nosso país em geral e na capital em especial. Porém, o que é certo é que estas são algumas das ideias revolucionárias que, provavelmente, mudarão por completo o panorama civilizacional de toda a pátria. Não duvido que a arte matará a fome, nem que Portugal recomece a apostar na caravela.

A única objecção directa que coloco à candidatura de Manuel Maria Carrilho ao município de Lisboa reside no facto de Maria de Belém aparecer na televisão e em vários cartazes de campanha ao lado de Carrilho. É assaz constrangedor ver uma figura tão brilhante e tão cheia de ideias aparecer ao lado de uma senhora que gosta de se pavonear no seu carro em direcção ao infinito. Mas talvez isso seja sinal que Carrilho é um homem de sentimentos, um homem que, mesmo apreciando Lacan, dá uns pulinhos em Dan Brown.

[Paulo Ferreira]